Entre as várias idas e vindas ao banheiro, um fato sempre me
prendeu a atenção: as conversas anônimas de boxes.
É extremamente comum ver as inscrições que, para alguns,
recebem o nome de ‘pichações’, enquanto, para outros (especialmente no universo
acadêmico), recebem o nome de ‘intervenções urbanas’.
Independentemente da nomenclatura, há de se ressaltar o
caráter cômico que algumas inscrições.
Há alguns dias, por exemplo, estava no ofício diário sagrado quando comecei a
ler as paredes. Não poderia faltar, obviamente, críticas ao reitor:
“Rodas: ditador
pós-moderno”, dizia. Alguém acrescentou alguns detalhes, com outra caneta,
transformando a mensagem em “Rodas: ½
ditador, ½ pós-moderno”. Confesso que achei curiosa a intervenção.
Noutro canto, foi possível ler: “FHC JÁ CAGOU AQUI”. Senti-me honrado por compartilhar a ilustre
presença, embora saiba que se tratava de uma inverdade. Aceitei o fato com uma
licença poética... Mas nem todos reagiram assim, porque alguém respondeu, com
uma caneta vermelha “cala a boca seu
burro”.
Mais à esquerda, porém na mesma linha, lia-se um imponente “o amor é importante. porra”. E confesso
que essa mensagem eu já tinha visto em outros lugares, na rua inclusiva.
Instantaneamente criou-se um sentimento de empatia entre mim e ela. Reconheci
ali algo familiar, além de uma mensagem de profundidade surpreendente.
No canto inferior, observei o último diálogo perfeitamente
legível. Alguém, revoltado, escreveu: “Seu
lixo é a comida dos outros”. Saindo da frase havia uma seta que
desembocava, justamente, na direção do lixinho ao lado do vaso sanitário.
Alguém, indignado com o protesto, resolveu protestar também, escrevendo em letras garrafais: “A SOLUÇÃO PARA FOME MUNDIAL É O LIXO, VAMOS TODOS COMER COCÔ!”.